Tem sido rotulado de génio, profeta, visionário, às vezes de excêntrico e outras vezes ignorado por ser um sonhador utópico, mas no fim de contas, independentemente do que digam, ele é Jacques Fresco (nascido em 1916).
O criador e mentor do Venus Project, um trabalho monumental de vários campos do conhecimento que unificam o conceito de um novo futuro para a civilização humana. Toda a vida de Fresco é, talvez, a definição de segunda oportunidade, uma nova hipótese de progresso social em harmonia com o nosso planeta e a tecnologia.
Sr. Fresco, pode descrever-nos de forma sucinta o que é o Venus Project?
O Venus Project é uma tentativa de trazer a paz ao mundo e juntar todas as nações. Se não quisermos guerra, mortes, a maior parte dos crimes, temos de redesenhar o modo como a sociedade funciona. Temos de declarar todos os recursos da terra como herança comum de todos os povos da terra. Depois temos de descartar o sistema monetário que é essencialmente corrupto. Depois disso temos de ultrapassar gradualmente a necessidade de termos fronteiras artificiais que separam as pessoas. E assim temos um mundo a trabalhar cooperativamente, preservando o ambiente e todas as manifestações de vida, tal como nós as conhecemos.
E qual é o aspecto mais importante deste projeto?
Uma economia baseada nos recursos que declara todos os recursos herança comum de todos os povos do mundo.
Pode explicar a diferença entre uma economia baseada no dinheiro e uma economia baseada nos recursos?
A economia baseada no dinheiro produz incentivos, mas também promove a corrupção, pagamentos a senadores, certas corporações compram senadores, nunca foi uma democracia. Nunca tivemos uma democracia. Nenhuma nação teve uma democracia. Se não há igual poder de compra, não se pode ter uma democracia.
Como é que o Venus Project se pode comparar com o comunismo?
O comunismo usa o dinheiro. Tem estratificações sociais. Tem bancos. Tem exércitos e marinhas. Prisões e polícias. Nós não temos nada disso.
Falemos sobre a sociedade, em muitas das suas comunicações o senhor tem dito que nós estamos condicionados a pensar de determinada maneira. Isto é verdade?
Se o senhor fosse educado pelos caçadores de cabeças do Amazonas desde criança, se nunca tivesse visto mais nada, seria um caçador de cabeças. Se tivesse nascido na Alemanha Nazi onde tu o que visse fosse “Heil Hitler, Deutschland Uber Alles”, seria alemão. Por isso, penso que todas as pessoas estão perfeitamente adaptadas ao sítio de onde são. Não há pessoas boas e más, és educado a odiar determinadas pessoas. Mas do sítio de onde elas vêm, isso é normal. Se fores educado no Sul, numa região sem educação, talvez te tornes membro do Klu Klux Klan, falas com um sotaque do Sul. De onde é que aprendeste isso? Do ambiente. De onde é que aprendes “Eu vou mazé pegar num preto e dar-lhe cabo do canastro”? Apanha-se isso do ambiente. Não se trata de as pessoas serem boas ou más, são educadas num ambiente anormal ou corrupto.
Acha que vivemos num mundo onde a comunicação é deficiente, onde às vezes ela restringe a linguagem, e a expressão de emoções e pensamentos. Isto é correto?
Sim. A nossa linguagem tem centenas de anos de idade. Isto torna extremamente difícil falarmos uns com os outros. Falamos uns para os outros. Isto quer dizer que uma pessoa às vezes diz “Tenha um bom fim-de-semana.” Por que é que não diz, “Tenha uma boa vida.” Porquê só fim-de-semana? Porque a nossa linguagem é tão antiga que se tornou automática e não tem significado. Tem de haver uma linguagem que não seja sujeita a interpretação. Quando lê a Bíblia, o senhor diz, “Jesus queria dizer isto,” outro diz, “Não, ele queria dizer aquilo,” aqueloutro diz, “Não, queria dizer isto,” depois temos os luteranos, os adventistas do sétimo dia, porque está sujeita a interpretações. A linguagem não é sujeita a interpretações: matemática, engenharia, química, física, engenharia estrutural, não estão sujeitas a interpretação. Não se conseguia construir uma ponte. Se um engenheiro dissesse, “Acho que ele queria dizer isto,” e outro dissesse, “Não, ele queria dizer aquilo.” Por isso, é possível desenvolver uma linguagem que não esteja sujeita a interpretações.
E o que acha do termo democracia?
A democracia é uma vigarice. É uma palavra inventada para paralisar as pessoas. Para as fazer aceitar uma determinada instituição. Todas as instituições dizem: “nós somos livres.” Assim que ouvir falar em liberdade e democracia, tenha cuidado. Porque numa nação verdadeiramente livre ninguém tem de lhe dizer que é livre.
Ouvi dizer que o senhor disse que à medida que os sistemas de poder começarem a ruir eles tenderão a defender-se com o fascismo para preservarem o status quo. A situação que vivemos hoje em dia é assim?
Hoje em dia caminhamos na direção de um fascismo. Cortando nas liberdades, nas poucas liberdades que temos. Nunca tivemos liberdade total. Porque a palavra liberdade não tem significado. Quando um árabe entra no nosso país (EUA) com dez mulheres, nós dizemos, “Só pode trazer uma,” por isso é melhor não usar a palavra liberdade. É melhor dizer que há um certo tipo de comportamentos que permitimos na sociedade. É assim que é. Não usem a palavra liberdade.
O que acha da recente crise económica nos EUA e a recessão global? É uma lição a ser aprendida?
Não. Porque é preciso uma recessão, perda de empregos e perda de respeito pelos líderes eleitos. Quando isso acontece, temos mudanças sociais. A mudança social não vem do intelecto, vem do sofrimento das pessoas. E quanto mais as pessoas são dispensadas, mais respeito elas perdem pelos governos que existem e irão procurar uma nova direção. Se demasiadas pessoas procuram uma nova direção, os governos chamam o exército e a polícia para lidar com a sociedade. Isso chama-se fascismo.
Falemos de guerra e tecnologia. Em 1961, o Presidente Eisenhower dá-nos conselhos sobre os complexos militares. Era uma profecia que se está a cumprir agora?
Bem, eu diria que ele não levou isso suficientemente longe. Ele deveria ter explicado isso de diversas maneiras. Dizer apenas, “tenham cuidado com a indústria do armamento,” não chega. Porque as pessoas não sabem o que isso quer dizer exatamente.
Sim, mas nós vimos as imagens das Torres Gémeas a cair a 11 de Setembro, também vimos as bombas a rebentar nos países do Médio Oriente, como o Afeganistão, Iraque. O que acha disto? E qual é o seu entendimento sobre o futuro desta guerra?
Todos os sistemas se querem perpetuar. Nós não levamos a democracia a outros países. Nós vamos lá por causa dos recursos deles. Petróleo, metais, mão-de-obra barata. Nós levamos democracia. Nós tirámos esta terra aos índios. Roubámo-la. Depois de tirarmos a terra, tirámos o Novo México ao México e tirámos a Califórnia à Espanha. Depois de roubarmos toda a terra que precisávamos fizemos um cartaz a dizer “Não roubarás.” Todas as nações são corruptas. Todas. Não há nenhuma nação que saiba o suficiente sobre ecologia para lidar com os problemas. Todos os políticos são, essencialmente, homens ignorantes. Todos. Desde sempre na história. Os nossos problemas não são políticos. Eles seriam bons há cem anos atrás. Mas hoje em dia são técnicos. Transportes seguros, produção com abundância, tornar as coisas à disposição das pessoas sem o uso de dinheiro. Enquanto houver dinheiro, haverá corrupção, por muitos tratados que assinarmos, por muitas leis que fizermos. 90% das leis feitas pelo homem são irrelevantes. Nós não precisamos de leis. As pessoas precisam de acesso às necessidades que têm na vida. Quando isso acontece, elas não roubam.
Algumas pessoas dizem que a ambição, a violência, o ódio hão-de sempre existir. O que acha disto?
Não existe essa coisa chamada “natureza humana.” Se não ainda viveríamos em cavernas. Se a natureza humana não mudasse. É aprendida. Quando a tua mãe te diz, “és luterano”, não brincas com aquele rapaz “católico”. Por isso, os pais doutrinam os seus filhos, no futuro os pais serão educados a educar crianças. Temos de educar crianças, porque as crianças podem aprender qualquer coisa. Podem aprender geologia, física, química, mas nós damos-lhes lixo. Nós temos clubes do Rato Mickey nos EUA. Que vergonha! Temos crianças e lemos-lhes coisas do tipo a vaca faz “mu-mu”. Isto não são maneiras de educar as crianças.
Sabe que as pessoas não o irão ouvir. Porquê persistir nestes ideais?
Porque foram educados a não ouvir. Foram educados a: “Qual é o maior país do mundo?” – “EUA.” “Qual é... o país mais inventivo do mundo?” – “EUA.” Mas não nos dizem de onde veio a impressora. Todos os estrangeiros que vieram para este país, trouxeram consigo linguagem, religião, ideias, tecnologia, por isso devemos tanto... por exemplo, se não sabe, um árabe chamado Al-Jabr deu-nos a álgebra, o grande museu do Egipto há uns anos e uma biblioteca um vasto conhecimento sobre o mundo. Por isso devemos tanto a tantas nações... a separação das nações é perigosa, errada e um falhanço das nações para trabalharem em conjunto. É isso que é a guerra. A guerra é um fracasso absoluto de ultrapassar as diferenças entre nações. No futuro não haverá exército. Haverá pessoas que aprendem. Os soldados são máquinas de matar. Ensinamo-los a matar. E a outra nação ensina os seus soldados a matar. Aquilo que eu faria era ensinar os soldados. Mandá-los para a escola sem terem de pagar para aprenderem a serem solucionadores de problemas. Como ultrapassamos a diferença entre a Arábia Saudita e este país? Como ultrapassamos a diferença entre a Venezuela e outro país? É isso que é preciso. Ciência aplicada aos governos. Até agora temos opiniões de políticos que não sabem nada sobre ecologia, segurança, engenharia, aumento das médias agrícolas, são completamente incapazes. E o futuro olhará para trás, as crianças do futuro dirão, “Mas não viam que o sistema monetário corrompia as pessoas com dinheiro? Não viam o que era óbvio?” E nós diremos, “não, nós éramos educados assim, não sabíamos distinguir as coisas”. As crianças não irão perceber isso no futuro.
Entrevista retirada de Russia Today. Fevereiro de 2010.