Fui ontem ver, a Carcavelos às 21.30h, numa sala onde não estavam mais de dez pessoas,
Aquele Querido Mês de Agosto de Miguel Gomes. O filme foi recentemente premiado no Chile, no Festival de Cinema de Valdivia, e já atingiu em Portugal a bonita soma de 17.000 espectadores.
É um filme que cruza o género documental e a ficção, que acaba por se concentrar numa família "disfuncional" de pai e filha que anima festas de Verão num grupo de música ligeira perto de Arganil, no centro de Portugal.
Em traços gerais, o lado documental do filme é-nos apresentado na primeira parte, ficando reservada a ficção para a segunda. Contudo, as personagens que veremos na ficção já são nossas conhecidas, já vimos estes rostos em contextos reais. Mecanismo brilhante que ajuda o filme a colocar aquela realidade no plano da ficção.
Depois de nos deliciarmos com diversas histórias sobre o moleiro que salta da ponte uma vez por ano (curiosamente como em
Accattone de Pier Paolo Pasolini!), e com as inevitáveis superstições ligadas a santos e procissões, a realização apresenta-nos dois jovens: ela é Tânia (Sónia Bandeira), vigia florestal nas férias, ele é Hélder (Fábio Oliveira), jogador de hóquei em patins e bom estudante.
São os dois jovens primos que se apaixonam nas férias, enquanto tocam no grupo de baile, sob o olhar perscrutador de um despeitado pai teclista. É uma história de amor e medo. De costumes fechados e novos mundos que se perspectivam, de passagem para a idade adulta - o sexo a ela associado.
Filme muito bem montado e realizado, com um trabalho pormenorizado e cuidado a nível sonoro que nos dá os vários níveis a que história se joga. A fotografia é belíssima, alternando os contrastes com as paisagens. Faltou talvez um maior trabalho a nível dos actores, mas acho que até isso seria injusto dizer. Sónia Bandeira e Fábio Oliveira são magníficos no filme.
Este cruzamento de realidades do filme não deixa de nos atrair e no final saímos com um sorriso. Tal como a rapariga que perde a virgindade e o amor da sua vida no mesmo momento mas acaba a rir do que se passou - aliviada por poder prosseguir a vida sem fantasmas, guardando dentro de si o momento irrepetível.
O filme foi nomeado para o concurso de Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. Era muito bonito que fosse com este filme genuinamente português que Portugal conseguisse esse prémio. Pelo cinema português tão atacado sempre por todos nós, e pelo próprio filme que é realmente belo.
Se ainda o podem ver no cinema não percam a oportunidade.