Uma vez instaurada a República os seus chefes começaram a pensar nos meios de consolidar o novo regime. Uns consideravam racional a preservação por um certo tempo do governo provisório, outros achavam que se tornava necessário estabelecer imediatamente uma forma de governo definitiva. Na opinião dos primeiros era necessário consolidar a situação interna. Os outros achavam que a República devia, antes de mais nada, conquistar a confiança dos outros países, já que todos os governos europeus decidiram não reconhecer o novo regime português até que este fosse aprovado por uma Assembleia Constituinte. O segundo ponto de vista triunfou. A 28 de Maio de 1911 realizaram-se as eleições para a Assembleia Constituinte. Entre os eleitos estavam todos os membros de governo provisório, entre eles Teófilo Braga e Bernardino Machado. Em manifesto de 6 de Junho de 1911 dizia-se que a Assembleia Nacional Constituinte proclamava a liquidação para sempre da monarquia, a expulsão de Portugal da Casa de Bragança e o estabelecimento no país da forma republicana de governo que receberia o nome de «República Democrática».
Na reunião de 11 de Agosto de 1911 da Assembleia Constituinte foi aprovada a Constituição da República Portuguesa, que estipulava a responsabilidade do presidente e dos ministros perante o Congresso.
A 24 de Agosto de 1911 efectuou-se a reunião da Assembleia Constituinte que deveria eleger o presidente da República. A maioria dos portugueses considerava como candidato mais provável a este posto o ministro das Relações Exteriores do governo provisório, Bernardino Machado, um dos mais activos dirigentes do Partido Republicano e da revolução. No entanto, foi eleito presidente o chefe da ala moderada do Partido Republicano, Manuel de Arriaga, doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, advogado de profissão, membro do Partido Republicano desde a sua fundação e participante na revolução de 1910. A eleição para o posto de presidente deste promotor geral da República foi uma surpresa para toda a opinião pública portuguesa. Os resultados da votação foram consequência das divergências havidas dentro do Partido Republicano quanto à lei que separava a Igreja do Estado e regulava a questão dos carbonários. O grupo de Afonso Costa e Bernardino Machado manifestou-se pela manutenção desta lei sem alterações e pela conservação da sociedade secreta dos carbonários. Eles consideravam que a organização dos carbonários era necessária para a consolidação da República. Pelo contrário, os partidários de Arriaga exigiam a liquidação dos carbonários. As divergências levaram à cisão dentro do Partido Republicano e à formação de vários agrupamentos políticos hostis.
O novo governo republicano foi encabeçado por João Chagas, ex-ministro português em Paris. Todos os membros do governo pertenciam aos meios universitários e apenas três deles haviam sido deputados à Assembleia Constituinte. O gabinete tinha em vista o estabelecimento da unidade de todos os republicanos, a garantia da supremacia do poder civil e o combate ao clericalismo.
A situação no país continuava tensa. O regime republicano não tivera tempo ainda de afirmar-se no poder e já a contra-revolução levantava a cabeça. A grande burguesia comercial e os senhores de terras preparavam-se para derrubar a República, buscando para tanto o apoio dos monárquicos emigrados, sob a chefia do chefe do Partido Conservador, Paiva Couceiro. Segundo o plano dos monárquicos o golpe principal deveria ser assestado no Norte, a região agrária mais atrasada do país, contando portanto com o apoio dos camponeses. Dos seus planos fazia parte colocar no trono português o príncipe de Buttenberg, irmão do rei da Inglaterra. Na noite de 29 para 30 de Setembro de 1911 os monárquicos tentaram ocupar os quartéis da cidade do Porto. Isto deveria ser o sinal para que as forças anti-republicanas entrassem em acção. A conspiração foi porém descoberta a tempo e presos os que nela participavam.
Os governos da Inglaterra, Alemanha, França e Rússia não empreenderam quaisquer tentativas no sentido de restaurar a dinastia dos Braganças. Alguns meses antes do desencadeamento da revolução os chefes do Partido Republicano buscaram o apoio dos governos de Londres e de Paris para o caso da mudança da forma de governo em Portugal. O ministro dos Negócios Estrangeiros da Inglaterra, Edward Grey, referindo-se à aliança com Portugal, afirmou que a mudança de regime neste país não virá alterar a essência dos acordos entre os dois países, já que a Inglaterra é aliada do povo português. Este facto veio mostrar claramente que o governo inglês não se manifestava contra o derrubamento do regime monárquico em Portugal. Para ele era importante a aliança com Portugal, que lhe trazia vantagens políticas e económicas. A declaração oficial do governo republicano sobre a sua intenção de manter a tradicional aliança com a Inglaterra e fomentar as relações com os outros países dava às potências europeis fundamentos para considerarem que a modificação do regime político em Portugal não atingiria essencialmente os interesses dos países estrangeiros, nem na própria metrópole nem nas suas colónias, e que Portugal continuaria fiel a todos os compromissos assumidos no que se refere aos tratados e acordos internacionais. Os governos dos países imperialistas viam que a própria existência da República dependia em muito deles e que o governo português era maleável e estava pronto a fazer todas as concessões a estas potências.
As companhias estrangeiras que se constituíram ainda nos tempos da monarquia dispunham de vantajosos contratos para muitos anos. Os seus negócios floresciam. Quando surgia qualquer desentendimento entre as companhias e as autoridades locais, imediatamente os representantes diplomáticos estrangeiros intervinham a favor dos interesses dos monopólios e impunham as suas condições ao governo republicano. Dessa forma, quase todos os conflitos eram resolvidos a favor das companhias estrangeiras, consolidando-se a sua posição privilegiada no país e nas colónias.
Desde a proclamação da República em Portugal despertava cuidados a situação nas colónias portuguesas em África. A declaração do ex-primeiro-ministro francês Caillot, segundo a qual a situação das potências na África Central não podia ainda considerar-se definitivamente estabelecida, pôs de sobreaviso a burguesia portuguesa. Quando na imprensa germânica apareceu uma série de artigos com alusões à divisão das colónias portuguesas, o primeiro-ministro português Augusto de Vasconcelos considerou necessário declarar que entre a Alemanha e a Inglaterra não existiam quaisquer tratados secretos que ameaçassem a inviolabilidade de Portugal e das suas colónias.
Na década de 90 do século XIX, por ocasião da aguda crise económica, por mais de uma vez levantou-se na imprensa portuguesa o problema da divisão das colónias. Expressava-se a opinião de que as colónias levavam Portugal à falência. Alguns políticos e jornalistas, tais como Rodrigues de Freitas, Oliveira Martins e outros, aconselhavam mesmo que se vendessem as colónias, que foram avaliadas em 625 milhões de francos. Entretanto, este sentimento de insegurança e este desnorteamento passaram logo que houve uma melhoria da situação e a exploração das colónias passou a dar lucros suplementares. Na Imprensa portuguesa surgiu a opinião de que Portugal sem as colónias não teria bases para uma existência independente no seio dos países europeus. Em Novembro de 1910 o governo provisório declarou que Portugal se sentia suficientemente forte para manter todas as suas possessões coloniais. Assim, o novo governo republicano, uma vez chegado ao poder, prosseguiu quanto às colónias a tradicional política de rapina que fora seguida pela monarquia, procurando manter os vastos domínios coloniais por meio de uma exploração impiedosa e do sufocamento bárbaro das revoltas tentadas pela população local.
Nikolai Efimov. Site do PCP.