Se algum dia me perguntassem: qual foi o espectáculo que mais prazer te deu fazer? Na resposta e na memória quase de certeza que estaria Primeiro Amor, uma pérola de Samuel Beckett que Miguel Borges magistralmente representou e encenou em 2001 no antigo espaço da Capital / Teatro Paulo Claro. O processo de ensaios foi longo mas acho que podia ter durado para sempre. Só há uma palavra: prazer. Lembro-me de o ver representar este texto de todas as maneiras e feitios. Sentado no chão de terra, na cadeira a comer laranjas, a fumar, a tagarelar, ou simplesmente a decorar o texto, e de todas as vezes era um prazer imenso vaguearmos pela prosa fluida do Francisco Frazão a partir do humor impagável de Samuel Beckett.
Divertimo-nos muito nesses dias e semanas e tenho a certeza que todas as pessoas que viram o espectáculo conseguiram perceber todas as infinitas variações de significados que o Miguel conseguia dar. Apenas porque, pura e simplesmente, conseguimos transformar todo o suor e amor no trabalho em vida em cena.
Quando é assim, o teatro é realmente maior do que a vida.
"Naquela altura eu não percebia as mulheres. Aliás agora também não. Nem os homens. Nem os animais. O que percebo melhor, e não é dizer muito, são as minhas dores."
Samuel Beckett