A velocidade a que a política internacional muda devido às eleições nos EUA é delirante e vertiginosa. Já não bastava os dois candidatos à presidência serem de uma indigência incomensurável, agora temos também de contar com os imprevistos que, no caso dos EUA, têm sempre características hollywoodescas.
Em Portugal, gostamos de acreditar que os partidos Conservador e Democrata correspondem mais ou menos a uma Direita e Esquerda europeias. Nada mais longe da verdade. Nos EUA não há esquerda. São dois partidos de direita que se alternam no desgoverno do seu país e do mundo ocidental. E nós, Portugal, o mundo Ocidental, a NATO e os seus vassalos, todos a reboque desta demência coletiva. Até quando?
Donald Trump sobreviveu por milagre a uma tentativa de assassinato. Dizem-nos agora que o assassino era um miúdo de vinte anos e que não é fácil saber o móbil do crime, que agiu sozinho (como se isso fosse possível). Continuamos a acreditar em tudo o que vem dos media norte-americanos, como se fosse a verdade lapidada pelo mais purificador dos filtros, mas o que nos continuam a deitar em cima são apenas as mentiras mais escabrosas que se conseguem inventar. E eles já nem disfarçam. A manipulação da verdade a partir de Washington não é uma circunstância, é um modus operandi.
Joe Biden é o presidente e agora candidato mais incompetente que alguma vez os EUA tiveram. E era difícil fazer pior depois de George W. Bush. Não só está senil (e a culpa não é dele) como querem à força fazer-nos acreditar que está tudo bem com ele. Começou muito mal e está a acabar pior. Aliás, quando um Presidente começa a sua presidência a insultar os Presidentes dos outros países como ele fez: "Putin é um assassino," só pode terminar mal. Não só é mau presidente, como, com ele rebentaram duas guerras brutais. Nenhuma delas envolve os EUA diretamente, mas as duas são da inteira responsabilidade desta administração. Agora, as conferências de imprensa da secretaria de Estado são risíveis, a maneira como o defendem é simplesmente absurda. Os episódios caricatos sucedem-se e os seus apoiantes começam a fugir e creio que vão conseguir obrigá-lo, mais tarde ou mais cedo, a ceder e desistir da corrida para a Casa Branca. É demasiado confrangedor. As ações já estão em campo, acabam de anunciar que o candidato democrata testou positivo à COVID-19. Ah, que conveniente viruzinho. Cheira-me que será através dele que começarão a afastar o senhor da corrida presidencial.
Por muito estranho que pareça, não interessa sequer saber quem mandou matar Donald Trump. Já começou a correr uma notícia de que o Irão estaria metido no assunto. Parece-me tão absurdo como todas as mentiras que nos querem fazer engolir. São apenas cortinas de fumo para não se perceber o mais evidente de tudo: há duas semanas, Biden disse que Trump devia ser posto debaixo de uma mira (in a bull's eye). Literalmente, disse isto. Ele está senil, mas disse-o. Ele próprio o confirmou e justificou dizendo que queria dizer que deveriam manter Trump debaixo de olho, que se deveriam focar nele. Sim, sim, pois, pois. Já me tinhas dito. Patético. Não sei se o Presidente dos EUA dá ordens destas à frente de toda a gente, mas pelo andar desta carruagem, não vejo porque não poderia. A imbecilidade, a boçalidade e a indecência já ultrapassaram todos os limites.
Entretanto, Donald Trump, ainda em choque, a cara dele diz tudo, passeia-se como zombie, até agora, pela convenção republicana, recebendo aplausos e louvores pelo seu desempenho após o atentado. Tenho em crer que já deve ter sido ameaçado dezenas de vezes, ele próprio deveria saber que corria esse risco, mas uma coisa é correr o risco e outra ouvir passar uma bala a um centímetro do crânio. É o verdadeiro Faroeste, a maior democracia do mundo.
Vi o debate todo destas duas sumidades do disparate. Sim, é verdade, vi. Sou maluco. Era só para ver o nível. Qual deles o pior. Um balbucia o outro não tem nexo nenhum. Um formula as frases sempre da mesma maneira, mlrgh, mlrgh, "A ideia de que..." e enumera "1 - "; "2 - " deve ser para não se perder; o outro carrega sempre na mesma tecla de que entraram 18 milhões de criminosos e doidos do manicómio no país e que no tempo dele havia H2O muito limpa. Nem uma ideia, nada, apenas a reiteração sem contraditório de que o outro não presta para nada e eu sou o melhor do mundo.
No final chegaram mesmo a discutir quem é que era melhor a jogar golf. E ficaram verdadeiramente chateados um com o outro. E desafiaram-se. Até que um deles disse "é melhor não nos comportarmos como crianças". A frase mais sensata da noite.
O mais grave disto tudo é que estes dois senhores, os dois últimos presidentes do país mais poderoso do mundo, um com 82 e outro com 78 anos, não dizem ao que vêm e demonstram que ambos são medíocres como não se pode ser num cargo como este. É mau demais para ser verdade.
E são estes os líderes do mundo ocidental. São estes os líderes que vão determinar a política ocidental, europeia e portuguesa. Que indigência. Que medo. E vai o António Costa falar com eles...? Sobre quê?
Uma das coisas mais extraordinárias dos últimos tempos, a nível de política internacional, é a demonização de Vladimir Putin, o presidente russo, por parte de praticamente todas as instituições ocidentais.
Para começar, e não vir a ser acusado de putinista e coisas ainda piores, devo dizer que não o considero ingénuo nem um santo, e acho que até pode ter mandado matar gente, tal qual um gangster, tal qual o Obama matou o Osama, tal qual a CIA mandou matar o Amaro da Costa e o Allende - não há fundo no poço das atrocidades cometidas pelos tiranos.
Dito isto, a maneira fácil como toda a gente da direita à esquerda mais radical ocidental culpa o russo por todos os males que vêm ao mundo é extremamente irritante e dá vontade de lembrar a todos das intermináveis guerras e regimes opressores que o
Ocidente promoveu e continua a promover por todo o mundo. Não digo isto para desculpar a Rússia dos atos de guerra que cometeu e comete todos os dias, mas para percebermos que para além da irracionalidade da guerra há sempre motivos para lutar. Houve um tempo em que a Rússia (a URSS) lutava em nome de todos os trabalhadores do mundo, em nome do proletariado, no final de tudo, percebemos que era mentira, não se podia lutar pelos trabalhadores e ao mesmo tempo mandá-los para os Gulags morrer. Hoje em dia, a Rússia luta em nome da sua pátria, em nome do seu país, porque se sente ameaçada pela constante expansão da NATO (leia-se Estados Unidos da América) na direção das suas fronteiras. Quem não quiser reconhecer isto, não perceberá nada do que se está a passar.
Quando a URSS se desmembrou, o presidente americano Ronald Reagan acordou não expandir a NATO para Oriente. Essa promessa não foi celebrada em nenhum tratado nem foi escrita em lado nenhum. Os ocidentais dizem agora que esse facto não os obrigava a nada, que podiam fazer o que quisessem e mais: os países são livres de aderir à NATO. Tudo isto pode ser verdade, mas isso não faz com que os russos se sintam enganados pelos europeus e americanos. Durante os anos 90, os americanos podiam fazer o que quisessem, a Rússia era demasiado fraca para poder responder, ainda que fossem sempre dizendo que não concordavam com essa expansão. Para se perceber a gravidade da situação basta lembrar a célebre crise dos mísseis em Cuba em 1962 quando o mundo esteve à beira do holocausto nuclear. Pura e simplesmente os EUA não deixavam a URSS instalar mísseis em Cuba devido à proximidade com o território americano. Era compreensível, claro. Porque razão, então, hoje em dia, não percebemos a mesma questão quando sabemos que a Polónia e muitos outros países da Europa de Leste possuem mísseis apontados à Rússia?
Em 2008, numa cimeira da NATO em Bucareste, onde foi expressa a vontade de acolher a Ucrânia e a Geórgia na NATO (países da antiga URSS - este facto não é de pouca importância), Vladimir Putin avisou o Ocidente de que isso seria considerada uma linha vermelha e a Rússia nunca permitiria isso. Mais tarde, nesse ano, em Agosto, durante os Jogos Olímpicos, a Rússia esmagou um levantamento na Geórgia que vinha provar que a Rússia não estava a falar de cor.
Em 2014, a CIA financiou e promoveu um golpe de estado a Ucrânia que acabou com a deposição do presidente ucraniano e o obrigou a fugir para a Rússia. Como retaliação, e impedir que a NATO "anexasse" a marinha russa instalada na Crimeia, a Rússia anexou a Crimeia onde mantinha a sua importante base naval de Sebastopol. Promoveu rapidamente um referendo onde se constatou que 90‰ da população de origem russa queria realmente aderir à Federação Russa. É ilegítimo? É. Mas é legítimo ameaçar a Rússia com instalação de inúmeras bases da NATO perto das fronteiras deles? Não, não é. Os ocidentais dizem que a NATO é uma organização defensiva. Mas todos sabemos da volatilidade desta declaração. Perguntemos aos habitantes de Belgrado na Sérvia em 1999 que viveram os horrores dos bombardeamentos defensivos da NATO quando o Ocidente da mesma maneira ilegítima separou o Kosovo da Sérvia. Morreram 5700 sérvios.
Ficou claro nessa altura que a NATO não era uma organização defensiva, era simplesmente o braço armado dos interesses americanos e europeus. Os sérvios calaram-se porque encheram a boca de bombas. Os russos calaram-se porque não podiam fazer nada, quem mandava era o bobo dos EUA, Boris Ieltsin.
A seguir à anexação da Crimeia, o Ocidente encheu a Rússia de sanções, instalando uma russofobia absolutamente repugnante e despropositada. Os russos e principalmente Putin são acusados de tudo. Interferir nas eleições americanas (um facto nunca provado, sempre desmentido, mas largamente difundido apenas para justificar a copiosa derrota que uma candidata corrupta obteve nas eleições de 2016). Foi o Putin que convenceu as pessoas a votar no Trump? Que culpa tem o Trump que a Hillary Clinton seja uma corrupta de meia-noite? Que culpa tem ele que o Obama tenha estado 8 anos na Casa Branca e a única coisa que deixou como legado foi Joe Biden (coitado) marioneta do lobby das armas. Que culpa temos nós da imbecilidade dos políticos europeus marionetas da hegemonia decadente americana?
Tudo isto é ainda mais complicado quando se percebe que os alemães andaram anos a congeminar um gasoduto com os russos, um projeto de vários milhares de milhões de euros, estruturante, sério como tudo, para ele depois ser dinamitado como num ato terrorista que obriga a Europa a comprar gás a - quem? - isso mesmo, adivinharam, aos EUA. Por causa disso, os preços da energia dispararam e nós preparamo-nos para pagar a inflação galopante que vem dos EUA depois da emissão de mais alguns triliões de dólares. Mas os europeus, muito avisados e sempre muito inteligentes, preferem continuar a combater uma guerra na Ucrânia em nome de - quê? - isso mesmo, adivinharam, em nome da democracia, mais uma vez. Ainda acreditamos que vamos espalhar a democracia pelo mundo bombardeando populações como fizemos no Afeganistão e no Iraque. E na Síria. E na faixa de Gaza. E no Iémen. E...
Este desabafo não terminou.
Aproximam-se mais umas eleições. Mais uma ocasião para mostrarmos que aqueles que nos governam não o fazem para o nosso bem comum. Não é assim desde o final dos anos 80 e as ignorantes gestões do Sr. Cavaco, não foi assim nos anos do displicente Guterres, continuou da mesma maneira com o misericordioso Santana Lopes e prossegue agora com o burro Passos Coelho. Aliás, basta ouvi-los falar. Basta ouvir os deputados e outros responsáveis dos partidos do governo para vermos o que defendem eles. A posição deles é clara. Do lado dos credores. Quantas vezes já ouvimos dizer "os credores não vão aceitar isso", "os credores isto e aquilo", "os credores não fazem parte do texto dos 74 e amigos", "os credores não vão emprestar", "os credores querem ser pagos", etc. A posição deles é sempre esta. Do lado dos credores. Nunca ouvimos os senhores do governo a dizer, "vamos falar com os credores porque a austeridade não pode resolver a crise", ou "as negociações com os credores terão lugar dentro de x dias". Não, nada. Aquilo que ouvimos é as posições dos credores através da boca do nosso próprio governo. É aviltante, mas é verdade.
Toda a gente sabe que a dívida externa portuguesa é muito antiga. Mesmo muito. Sempre fomos devedores, sempre estivemos à mercê dos credores. Mas, quando entrámos para a CEE podíamos ter invertido a história. Podíamos ter construído um país sustentável. Podíamos ter apostado na qualificação, na educação, na produção de bens de valor acrescentado. E o que é que fizemos pela mão do nosso Não-político Cavaco? Tivemos dez anos onde não havia Ministério da Cultura, dez anos onde os fundos estruturais foram estruturar os bolsos de uns poucos de amigos, abriu-se o país ao investimento estrangeiro para ele se aproveitar da nossa mão-de-obra barata, destruiu-se a produção agrícola, pesqueira, industrial. Todos sabemos isso. E quem é que fez isso? Quem é que era o chefe dessa pandilha? Isso mesmo, adivinharam, nada mais nada menos que o nosso atual Presidente da República. É preciso dizer mais alguma coisa?
Agora estamos no pior dos momentos no país porquê? Porque o presidente é esse senhor, o mesmo que não tinha uma ideia original nem que ela lhe saltasse para o colo, e como primeiro-ministro o tipo que era da juventude do mesmo partido. O betinho Pedro, que não faz a mínima ideia do que é trabalhar. Não faz, nunca fez, nem nunca na vida deve ter dado valor a ninguém que não esteja vestido de camisa e use uns sapatos de vela. Sim, até posso estar a exagerar e ser injusto e xenófobo, mas a conversa destes senhores da direita que estão no poder enoja-me. Enoja-me a sua ignorância, a sua corrupção, a sua prepotência. Eu devia tentar focar-me na política deles e tentar desmantelá-la. Mas depois penso. Qual política?
Para além dos intermináveis cortes, onde está a política. Se tirarmos os cortes da equação, qual é a política deles? Eu respondo. Nenhuma. Eles não têm política nenhuma. Porque até a fazer cortes se pode fazer política. Por exemplo, cortar em tudo menos na educação. Até percebia. Mas fazem eles isso? Não, não fazem nem nunca farão. Porque eles acham, como me dizia há uns tempos alguém, que a educação pública é para aqueles que não têm dinheiro para pôr os filhos na privada.
É preciso estar-se muito alheado, viver numa bolha à prova de tudo para não se perceber que este governo está a destruir o país para muitos e longos anos. Tenho a certeza que um dia alguém ainda analisará este período e os chamará de traidores. E terá razão.
Há um pássaro amarelo no meu olhar
Ele canta, mas não para mim
Vejo-o trinar
Mas não o ouço
Uma parede de vidro silencia-o.
Tenhos dois faróis no meu mundo
Iluminam-me, nas minhas trevas
Procuro a surpresa
Encontro a beleza
Num abraço eterno de vida e sol.
Ao meu lado um corpo de carne e ossos
Uma pessoa como eu
Tão perto tão longe
De mim, quanto eu
Agora, neste poema.
A memória do futuro afunda-se-me no cérebro
Revejo o passado, ele queima-me a pele
Dói-me o corpo do momento
Aqui e agora é tudo o que eu sei,
Num abraço eterno de vida e sol.
Eis-nos chegados ao mais baixo da indigência do país. A Merkel, a que manda em nós, a ponta do icebergue de iniquidades e incongruências em que se transformou a Europa, visita o país que sofre com a mais violenta onda de austeridade. Um país que se foi habituando a não ser nada. Um país que se foi habituando a não produzir nada, a viver à sombra de um Estado que subsidiava sem saber porquê nem para quê, um tecido industrial praticamente inexistente que foi vendido ao desbarato, desde as primeiras horas de entrada na então CEE, aos alemães, franceses e italianos. Um país que se especializou no trabalho não especializado, nas fábricas de automóveis e sapatos, na mão de obra barata que com o aparecimento em força do mercado chinês, demonstraram a estupidez da política seguida. Um país que desinvestiu na cultura e na educação, com medo do conhecimento, com medo de si próprio, um país que desistiu de si próprio.
E agora que já pouco resta, agora que o PSD-CDS ataca com toda a fúria o Estado Social, porque é muito caro, dizem eles, agora que fazemos, povo de Portugal? Digam lá! Esperamos pelas próximas eleições? Esperamos pelas próximas eleições, daqui a 3 anos para eleger o PS? É isto que queremos para o nosso país? Queremos empobrecer? Acreditamos realmente que andámos a viver acima das possibilidades, ou os sucessivos governos não souberam CRIAR uma verdadeira economia que sustentasse o Estado Social tal como nós o queremos ver?
O que queremos para o nosso país? O que queremos para a nossa sociedade, para os nossos filhos, para os nossos netos, para nós? Queremos acabar com a Segurança Social e com a saúde? Conseguiremos sair do buraco sem investimento público? É claro que não. É óbvio que não. Mas de uma coisa podem estar certos. Com o PSD-CDS, não haverá investimento público e com o PS, poderá haver investimento público, mas ele será controlado pelos boys todos que por lá pululam. Por isso, nas próximas eleições, não se esqueçam, tornem a votar nos mesmos.
Eu sei que não interessa para nada, mas atribuindo 3 pontos a cada medalha de ouro, 2 pontos à prata e 1 à de bronze, os países ficam assim alinhados:
1 - EUA - 225
2 - CHINA - 190
3 - RÚSSIA - 155
4 - GRÃ-BRETANHA - 123
5 - ALEMANHA - 85
6 - FRANÇA - 67
7 - JAPÃO - 66
8 - AUSTRÁLIA - 65
9 - COREIA DO SUL - 62
10 - ITÁLIA - 53
11 - HUNGRIA - 53
Hoje/quase ontem faz um ano que o governo PSD/CDS ganhou as eleições e formou governo. Querem mais disto? Eu não. Estou farto do Passos Coelho. Já nem o consigo ouvir. Quando ele começa a falar na televisão naquele tom professoral, vagaroso e paternalista a dizer que vivemos muitos anos acima das nossas possibilidades começo a ter vómitos e não aguento. É demais. Quando o Ministro das Finanças, aquele Vítor Gaspar, que eu nunca tinha visto mais gordo, começa a falar ainda mais devagar que o primeiro-ministro a dizer que vivemos muitos anos acima das nossas possibilidades, tenho vómitos e começo a ficar com urticária. Não quero mais disto. Aliás, acho que está na hora de começarmos a pensar em fazer a revolução. Sim, ouviram bem. A revolução. Derrubar o governo pela força. Empurrá-lo. Cagar na troika, sair do Euro e da Europa, bastar-nos a nós próprios, com aquilo que sabemos fazer.
Estou farto de vigaristas, corruptos e políticos que nos dizem que vivemos acima das nossas possibilidades. Para que conste: EU NÃO VIVO ACIMA DAS MINHAS POSSIBILIDADES MEUS CABRÕES, NÃO VIVO NEM NUNCA VIVI. VOCÊS É QUE VIVERAM A COMPRAR OS VOSSOS CARROS TOPO DE GAMA E FORAM PARA AS VOSSAS FÉRIAS NAS ILHAS CAIMÃO E EM CUBA E NO CARALHO QUE VOS FODA! Por isso, desapareçam do governo do meu país, que eu me habituei a amar, apesar de tudo o que vocês lhe têm feito! Despareçam! Vão-se embora, ninguém vos quer meus corruptos, vendidos e todos os outros que participaram nos governos desde o início dos anos 90 e que ESSES SIM, viveram acima das suas possibilidades e endividaram o nosso país, com políticas suicidas. São eles os verdadeiros traidores da pátria e são eles os responsáveis pelo estado a que chegámos.
VÃO-SE EMBORA!
Tem sido rotulado de génio, profeta, visionário, às vezes de excêntrico e outras vezes ignorado por ser um sonhador utópico, mas no fim de contas, independentemente do que digam, ele é Jacques Fresco (nascido em 1916).
O criador e mentor do Venus Project, um trabalho monumental de vários campos do conhecimento que unificam o conceito de um novo futuro para a civilização humana. Toda a vida de Fresco é, talvez, a definição de segunda oportunidade, uma nova hipótese de progresso social em harmonia com o nosso planeta e a tecnologia.
Sr. Fresco, pode descrever-nos de forma sucinta o que é o Venus Project?
O Venus Project é uma tentativa de trazer a paz ao mundo e juntar todas as nações. Se não quisermos guerra, mortes, a maior parte dos crimes, temos de redesenhar o modo como a sociedade funciona. Temos de declarar todos os recursos da terra como herança comum de todos os povos da terra. Depois temos de descartar o sistema monetário que é essencialmente corrupto. Depois disso temos de ultrapassar gradualmente a necessidade de termos fronteiras artificiais que separam as pessoas. E assim temos um mundo a trabalhar cooperativamente, preservando o ambiente e todas as manifestações de vida, tal como nós as conhecemos.
E qual é o aspecto mais importante deste projeto?
Uma economia baseada nos recursos que declara todos os recursos herança comum de todos os povos do mundo.
Pode explicar a diferença entre uma economia baseada no dinheiro e uma economia baseada nos recursos?
A economia baseada no dinheiro produz incentivos, mas também promove a corrupção, pagamentos a senadores, certas corporações compram senadores, nunca foi uma democracia. Nunca tivemos uma democracia. Nenhuma nação teve uma democracia. Se não há igual poder de compra, não se pode ter uma democracia.
Como é que o Venus Project se pode comparar com o comunismo?
O comunismo usa o dinheiro. Tem estratificações sociais. Tem bancos. Tem exércitos e marinhas. Prisões e polícias. Nós não temos nada disso.
Falemos sobre a sociedade, em muitas das suas comunicações o senhor tem dito que nós estamos condicionados a pensar de determinada maneira. Isto é verdade?
Se o senhor fosse educado pelos caçadores de cabeças do Amazonas desde criança, se nunca tivesse visto mais nada, seria um caçador de cabeças. Se tivesse nascido na Alemanha Nazi onde tu o que visse fosse “Heil Hitler, Deutschland Uber Alles”, seria alemão. Por isso, penso que todas as pessoas estão perfeitamente adaptadas ao sítio de onde são. Não há pessoas boas e más, és educado a odiar determinadas pessoas. Mas do sítio de onde elas vêm, isso é normal. Se fores educado no Sul, numa região sem educação, talvez te tornes membro do Klu Klux Klan, falas com um sotaque do Sul. De onde é que aprendeste isso? Do ambiente. De onde é que aprendes “Eu vou mazé pegar num preto e dar-lhe cabo do canastro”? Apanha-se isso do ambiente. Não se trata de as pessoas serem boas ou más, são educadas num ambiente anormal ou corrupto.
Acha que vivemos num mundo onde a comunicação é deficiente, onde às vezes ela restringe a linguagem, e a expressão de emoções e pensamentos. Isto é correto?
Sim. A nossa linguagem tem centenas de anos de idade. Isto torna extremamente difícil falarmos uns com os outros. Falamos uns para os outros. Isto quer dizer que uma pessoa às vezes diz “Tenha um bom fim-de-semana.” Por que é que não diz, “Tenha uma boa vida.” Porquê só fim-de-semana? Porque a nossa linguagem é tão antiga que se tornou automática e não tem significado. Tem de haver uma linguagem que não seja sujeita a interpretação. Quando lê a Bíblia, o senhor diz, “Jesus queria dizer isto,” outro diz, “Não, ele queria dizer aquilo,” aqueloutro diz, “Não, queria dizer isto,” depois temos os luteranos, os adventistas do sétimo dia, porque está sujeita a interpretações. A linguagem não é sujeita a interpretações: matemática, engenharia, química, física, engenharia estrutural, não estão sujeitas a interpretação. Não se conseguia construir uma ponte. Se um engenheiro dissesse, “Acho que ele queria dizer isto,” e outro dissesse, “Não, ele queria dizer aquilo.” Por isso, é possível desenvolver uma linguagem que não esteja sujeita a interpretações.
E o que acha do termo democracia?
A democracia é uma vigarice. É uma palavra inventada para paralisar as pessoas. Para as fazer aceitar uma determinada instituição. Todas as instituições dizem: “nós somos livres.” Assim que ouvir falar em liberdade e democracia, tenha cuidado. Porque numa nação verdadeiramente livre ninguém tem de lhe dizer que é livre.
Ouvi dizer que o senhor disse que à medida que os sistemas de poder começarem a ruir eles tenderão a defender-se com o fascismo para preservarem o status quo. A situação que vivemos hoje em dia é assim?
Hoje em dia caminhamos na direção de um fascismo. Cortando nas liberdades, nas poucas liberdades que temos. Nunca tivemos liberdade total. Porque a palavra liberdade não tem significado. Quando um árabe entra no nosso país (EUA) com dez mulheres, nós dizemos, “Só pode trazer uma,” por isso é melhor não usar a palavra liberdade. É melhor dizer que há um certo tipo de comportamentos que permitimos na sociedade. É assim que é. Não usem a palavra liberdade.
O que acha da recente crise económica nos EUA e a recessão global? É uma lição a ser aprendida?
Não. Porque é preciso uma recessão, perda de empregos e perda de respeito pelos líderes eleitos. Quando isso acontece, temos mudanças sociais. A mudança social não vem do intelecto, vem do sofrimento das pessoas. E quanto mais as pessoas são dispensadas, mais respeito elas perdem pelos governos que existem e irão procurar uma nova direção. Se demasiadas pessoas procuram uma nova direção, os governos chamam o exército e a polícia para lidar com a sociedade. Isso chama-se fascismo.
Falemos de guerra e tecnologia. Em 1961, o Presidente Eisenhower dá-nos conselhos sobre os complexos militares. Era uma profecia que se está a cumprir agora?
Bem, eu diria que ele não levou isso suficientemente longe. Ele deveria ter explicado isso de diversas maneiras. Dizer apenas, “tenham cuidado com a indústria do armamento,” não chega. Porque as pessoas não sabem o que isso quer dizer exatamente.
Sim, mas nós vimos as imagens das Torres Gémeas a cair a 11 de Setembro, também vimos as bombas a rebentar nos países do Médio Oriente, como o Afeganistão, Iraque. O que acha disto? E qual é o seu entendimento sobre o futuro desta guerra?
Todos os sistemas se querem perpetuar. Nós não levamos a democracia a outros países. Nós vamos lá por causa dos recursos deles. Petróleo, metais, mão-de-obra barata. Nós levamos democracia. Nós tirámos esta terra aos índios. Roubámo-la. Depois de tirarmos a terra, tirámos o Novo México ao México e tirámos a Califórnia à Espanha. Depois de roubarmos toda a terra que precisávamos fizemos um cartaz a dizer “Não roubarás.” Todas as nações são corruptas. Todas. Não há nenhuma nação que saiba o suficiente sobre ecologia para lidar com os problemas. Todos os políticos são, essencialmente, homens ignorantes. Todos. Desde sempre na história. Os nossos problemas não são políticos. Eles seriam bons há cem anos atrás. Mas hoje em dia são técnicos. Transportes seguros, produção com abundância, tornar as coisas à disposição das pessoas sem o uso de dinheiro. Enquanto houver dinheiro, haverá corrupção, por muitos tratados que assinarmos, por muitas leis que fizermos. 90% das leis feitas pelo homem são irrelevantes. Nós não precisamos de leis. As pessoas precisam de acesso às necessidades que têm na vida. Quando isso acontece, elas não roubam.
Algumas pessoas dizem que a ambição, a violência, o ódio hão-de sempre existir. O que acha disto?
Não existe essa coisa chamada “natureza humana.” Se não ainda viveríamos em cavernas. Se a natureza humana não mudasse. É aprendida. Quando a tua mãe te diz, “és luterano”, não brincas com aquele rapaz “católico”. Por isso, os pais doutrinam os seus filhos, no futuro os pais serão educados a educar crianças. Temos de educar crianças, porque as crianças podem aprender qualquer coisa. Podem aprender geologia, física, química, mas nós damos-lhes lixo. Nós temos clubes do Rato Mickey nos EUA. Que vergonha! Temos crianças e lemos-lhes coisas do tipo a vaca faz “mu-mu”. Isto não são maneiras de educar as crianças.
Sabe que as pessoas não o irão ouvir. Porquê persistir nestes ideais?
Porque foram educados a não ouvir. Foram educados a: “Qual é o maior país do mundo?” – “EUA.” “Qual é... o país mais inventivo do mundo?” – “EUA.” Mas não nos dizem de onde veio a impressora. Todos os estrangeiros que vieram para este país, trouxeram consigo linguagem, religião, ideias, tecnologia, por isso devemos tanto... por exemplo, se não sabe, um árabe chamado Al-Jabr deu-nos a álgebra, o grande museu do Egipto há uns anos e uma biblioteca um vasto conhecimento sobre o mundo. Por isso devemos tanto a tantas nações... a separação das nações é perigosa, errada e um falhanço das nações para trabalharem em conjunto. É isso que é a guerra. A guerra é um fracasso absoluto de ultrapassar as diferenças entre nações. No futuro não haverá exército. Haverá pessoas que aprendem. Os soldados são máquinas de matar. Ensinamo-los a matar. E a outra nação ensina os seus soldados a matar. Aquilo que eu faria era ensinar os soldados. Mandá-los para a escola sem terem de pagar para aprenderem a serem solucionadores de problemas. Como ultrapassamos a diferença entre a Arábia Saudita e este país? Como ultrapassamos a diferença entre a Venezuela e outro país? É isso que é preciso. Ciência aplicada aos governos. Até agora temos opiniões de políticos que não sabem nada sobre ecologia, segurança, engenharia, aumento das médias agrícolas, são completamente incapazes. E o futuro olhará para trás, as crianças do futuro dirão, “Mas não viam que o sistema monetário corrompia as pessoas com dinheiro? Não viam o que era óbvio?” E nós diremos, “não, nós éramos educados assim, não sabíamos distinguir as coisas”. As crianças não irão perceber isso no futuro.
Entrevista retirada de Russia Today. Fevereiro de 2010.
A INTERNACIONAL SITUACIONISTA E FRANK ZAPPA
O escritor que falou mais recentemente sobre o assunto da Internacional Situacionista, em relação com a música rock, foi Greil Marcus na sua arqueologia do substrato situacionista do punk – Lipstick Traces. Marcus analisa cuidadosamente as ideias conflituosas dos surrealistas, letristas e situacionistas com um tom de maravilha jovial, não recorrendo nunca à opinião ou à polémica. Ele encontra maneira de tornar estas agressivas e eletrizantes ideias espinhosas – como só um americano o podia fazer – (desenvolvidas de modo concreto, tal como Adorno descreveu a arte moderna – “desagradável no sentido de bem de consumo”) em pequenas migalhas douradas de consumo. É uma boa leitura. Apesar deste regresso, que se reflete no uso da palavra “situacionista” por toda a imprensa rock, a teoria foi originalmente explosiva e estruturava uma crítica que falava de arte e política num só fôlego. Não foi só o punk e Attali – todas as melhores ideias da crítica cultural da nova história de arte (Tim Clark era membro da ala britânica) até à literatura de vanguarda (Jeremy Prynne, Iain Sinclair), foram abandonadas pelas suas teses (só os excrementos de camelo têm mais aplicações). Uma indicação poderosa de que só os conceitos marxistas são capazes de transportar o bacilo da revolução.
No vácuo aberto pelo momento revolucionário do Maio de 1968, a IS não vingou porque fosse extremista, niilista e fria (embora o fosse), ou porque os membros escrevessem palavras de ordem nas gravatas (embora o fizessem), mas porque fazia uma análise marxista que não tinha qualquer relação com o stalinismo tanto do Partido Comunista como dos maoístas. Isto é esquecido. Não conseguiu influenciar os trabalhadores grevistas e os estudantes ocupantes e afastá-los da liderança do PC e da esquerda reformista, que começaram a devolver a revolução a De Gaulle e à polícia de choque. Não aprendeu de Lenine a necessidade de construir um partido revolucionário enraizado na classe trabalhadora: falhou. E isto também é esquecido.
Contudo, ao contrário dos tristes grupinhos de “seguidores situacionistas” que deixam críticas azedas contra tudo a apodrecer em várias livrarias de esquerda, os IS não eram anarquistas ou indivíduos românticos. Eles compreendiam a natureza do estado e a importância dos concelhos de trabalhadores; tinham uma visão realista do equilíbrio das forças de classe. Ao contrário de Sartre, viam através do terceiro mundismo de Fidel Castro e Mao; ao contrário das Brigadas Vermelhas opunham-se ao terrorismo porque não conduzia à atividade de massas; ao contrário do Partido Comunista viram a necessidade de uma especial unidade entre trabalhadores e estudantes. Por isso, as opiniões deles sobre Zappa merecem ser registadas. Em 1967, Raoul Vaneigem dizia o seguinte:
A única maneira de fazer um breve afloramento estético é atentarmos momentaneamente no espetáculo da decomposição artística: David Hockney, Frank Zappa, Andy Warhol, Arte Pop e Reggae podem ser comprados aleatoriamente em cadeias de lojas. Falar de um trabalho artístico duradouro, seria como dissertar sobre os valores eternos do petróleo.
A ideia do trabalho artístico “duradouro” revela um esteticismo incaracterístico, embora o modo como o livro de Vaneigem se deixa enfeitiçar por encantamentos puristas – repetidos ad nauseam – mostre realmente uma tendência idealista. A lista de nomes exibe a crueza da ênfase que a IS dá ao consumo (uma crueza que o pós-modernismo repete, apesar de possuir uma visão diferente). O crescimento dos anos 50 foi duro para os revolucionários: o capitalismo parecia dar tudo o que prometera. A crítica situacionista ao consumo – palavras de ordem que afirmavam que qualquer coisa que pudesse ser comprada não valia a pena, a completa aversão ao mundo mediático das famílias felizes – era um adeus definitivamente irónico aos anos 50, que depois seriam muito espoliados: desde as revistas de arte “radicais” como a Re/Search até à Igreja do Subgénio, os Devo e a auto-publicidade (o chique retrógrado dos anos 50 nos recentes anúncios de Brylcreem, por exemplo). Em Lancaster, na Califórnia, Captain Beefheart e Frank Zappa também esboçavam contra-medidas ao mundo conformista dos anúncios do pós-guerra.
Contudo, embora a crítica ao consumo signifique que mesmo uma economia em alta não nos deixa contentes, também significa que o alvo é sempre o mesmo. O cinismo de Vaneigem torna-se banal e intermitente. A possibilidade de se comprar reggae nas lojas não é aleatória, depende de uma variedade de factores: o grau de racismo na indústria discográfica, a presença de índios do oeste indígenas na área, o seu moral, o alcance da sua cultura e por aí adiante. Ao rejeitar o reggae e Andy Warhol, Vaneigem esquece que a música também pode ser o sangue da comunidade, a transmissão de notícias, conforto, fonte de força e resistência. Claro, a única maneira de distinguir entre consumidores diferentes é olhar para a sua relação com os meios de produção, o que significa olhar para eles como trabalhadores e não como consumidores. A IS só desenvolveu tal foco na classe trabalhadora depois da greve geral de 1968 ter começado. Apesar das suas muito-elogiadas “confraternizações” (partilhar uma garrafa de vinho com alguns grevistas à frente de um fotógrafo), era então muito tarde para as ideias revolucionárias da IS influenciarem o curso da luta.
O anti-consumismo de Vaneigem é, não obstante, preferível à celebração pós-modernista da “multiplicidade do baralha e torna a dar” do mercado, que de alguma maneira esquece a solvibilidade necessária para entrar no novo jardim do Éden. A IS gostava de fomentar o brilho especial que o capitalismo precisa para competir no mercado e depois concluir que se pode conseguir isso sem comprar nada. Como estratégia é bom, para pessoas envolvidas na criação de imagens de publicidade, confia no crescimento económico rápido, onde pode passar por corrente subversiva. Do mesmo modo, o punk achou que podia tomar momentaneamente a dianteira no ajustamento que o negócio do rock do final dos anos 70 conheceu, ao pegar fogo às figuras de palha do idealismo dos anos 60. Mas tanto a IS como o punk confiam na onda necessária ao desenvolvimento do capitalismo. Enquanto a explosão do rock dos anos 60 se estilhaçava no rock corporativo e disco dos anos 70 e o punk no domínio da inanidade MTV dos anos 80, parece que não se trata do simples assunto de encher as lojas com “substitutos” da revolução. Numa recessão, a retórica da IS parece desesperadamente deslocada: a verdadeira ameaça é o consumo em torrente sem quaisquer respostas críticas. Não há espaço para a crítica se expressar.
Vaneigem ataca o inimigo que conhece: os fornecedores de arte elevada que comercializam a vanguarda, arte que é precisamente projetada para resistir a tal mercado. Os anos 50 e 60 foram testemunhas de uma torrente herege de ideias anti-arte, da qual as artes visuais ainda não recuperaram. Dessas ideias hereges, a IS era a mais pura, a mais violenta, a mais engraçada e a melhor. Elevaram a um novo nível a crença de Adorno no impermutável.
Enquanto que no mundo real todos os particulares são fungosos, a arte protesta contra esses fungos ao pegar em imagens daquilo que a realidade devia ser se se emancipasse das normas de identificação impostas. Pelo mesmo princípio, a arte – a imago do impermutável – tende para a ideologia porque nos faz acreditar que há coisas no mundo real que não são para troca. No interesse do impermutável, a arte deve criar uma consciência crítica em relação ao mundo das coisas permutáveis.
Contudo, tal como os julgamentos de Adorno em relação à música radiofónica, a IS falou a partir da posição de arte elevada burguesa: só via o mercado de massas como degradação da singularidade do objeto artístico, vilipendiando implacavelmente os artistas que espalhavam produtos degradantes. Tornou-se um comité internacional cão-de-guarda, prevenindo o aproveitamento económico da anti-arte: se alguém em Roma estivesse a vender telas a metro como crítica à maneira como os expressionistas abstratos transformavam o “sofrimento” em dinheiro, a IS demoveria qualquer pessoa que tentasse fazer a mesma proeza noutro lado qualquer. Tais ideias subversivas têm uma enorme ressonância porque a ideia de arte irradia sempre o todo da sociedade, mas sem consciência de classe começam a reproduzir um desdém aristocrático pelo mercado – “Compraste numa loja? Oh, que coisa horrível.” A ideia da IS denunciar um “rasta” por ter comprado um disco de Big Youth é manifestamente absurda.
As ideias de Adorno funcionam melhor em estreita associação dialética com as de Walter Benjamin. Juntamente com a insistência de Adorno de que o trabalho artístico não pode abraçar o mercado e sobreviver, precisamos da visão de Benjamin e do novo materialismo no público de massas, que já não é mitificada pela singularidade do trabalho artístico, a “aura” (em si mesma uma versão secular do mistério religioso): o público de filmes de terror fala tecnicamente de como a tensão é criada; as considerações práticas sobre a profundidade do som grave num altifalante de doze polegadas ou num cd caseiro. Ao juntar Zappa, reggae, Warhol e Hockney que meramente conduzem “o espetáculo da decomposição”, Vaneigem ecoa Adorno ao mais alto nível, alheado do modo como a luta de classes se manifesta na música: da arena comercial como campo de batalha, uma guerra agitada por músicos, companhias discográficas e público sobre o dinheiro e o valor-prático. Essa merda tem groove? É uma pergunta materialista nunca formulada por nenhum dos tediosos debates sobre Morrisey ou Madonna como ícones do pop. Para aborrecimento dos jornalistas pop que reduzem tudo à sua conversa moralista, há valor-prático na música. Vaneigem fica tão ofendido com o espetáculo que para ele é tudo merda comercial, um monte de mercadorias sem sentido, oposto às suas rretóricas epetitivas da “vida vivida” e da “imaginação que tudo conquista”. Tais frases tornam-se meros encantamentos puristas do intruso profissional. Vaneigem falha a compreensão de que um disco de James Brown é uma coisa pessoal.
É um pouco como o argumento do pós-modernismo. Ao se opor ao regresso às velhas formas da música clássica – orquestras sinfónicas, tonalidade – o modernista é acusado de inconsistência ao gostar, por exemplo, de David Murray e da sua síntese de free jazz e swing em 1980. De facto, a acusação de inconsistência é originária de um idealismo similar ao de Vaneigem: pensar em abstrações que obscurecem factos sociais. O retorno à tonalidade na música clássica foi projetado para fazer recuar as descobertas feitas em Darmstadt nos anos 50 e 60, descobertas que não podiam ser discutidas por análises musicais escolásticas (daí o prestígio de Stockhausen, Boulez e Berio na academia) mas que alienavam os consumidores (sala vazias). Contudo, grande parte do argumento para tornar a música “mais acessível” é baseada num populismo demagógico (“multiculturalismo versus elitismo serialista”) que, de facto é favorecido pelo uso que a classe média faz da música clássica – cimento fortalecedor da identidade social, um sonho da ordem aristocrática tardia e do primitivo heroísmo burguês que só agora pode ser reavaliado como “kitsch”. A nova tonalidade adopta o irracionalismo em vez de enfrentar as consequências da forma (o que explica o reencontrado respeito pela religião por parte dos seus aderentes).
A análise material, por outro lado, não julga a arte por oposição a abstrações imutáveis, relaciona a arte com o seu papel histórico. O blues, o ragtime e o swing são invenções de pessoas oprimidas, formas adversas da mestria burguesa. A verdade da música pode estar em estreita ligação com a manutenção de especificidades étnicas que lutam contra a homogeneização académica e comercial e não seguir uma necessária evolução. Julgamentos abstratos sobre os “avanços” e os “recuos” (por exemplo, condenar John Lee Hooker de ser reacionário por ainda tocar blues) são inapropriados. O uso que o músico negro faz do blues não é o mesmo que um músico clássico faz da sonata. Da mesma maneira que falar das “raízes” de um compositor branco europeu, adoptando o calão nacionalista negro, contém uma corrupção racista (mesmo se o próprio W.E.B. Du Bois tenha tirado a sua ideia de orgulho negro das tradições filosóficas alemãs que alimentaram a teoria racial). Como Lenine mostrava na sua discussão sobre nacionalismo, uma ideia pode ter diferentes consequências políticas, dependendo do papel global (imperialista ou colonizado) da nação em questão. A crítica idealista, que julga as coisas de acordo com uma disposição neutra de ideias abstratas (ex. “consumo” versus “não consumo”), provoca normalmente asneiras desastrosas.
O sucesso do feminismo nos estudos culturais tem conduzido aos termos “sexista” e “não sexista” substituindo as categorias morais de “melhoramento” ou “corrupção” usadas tradicionalmente por Matthew Arnold e F.R.Leavis. Isto parece basear-se em distinções estéticas em vez de conceitos morais. Contudo, quando usado fora de uma compreensão concreta da forma musical, os termos constroem meramente um outro idealismo, suscetível – como todos os idealismos – de contradições gritantes. Quando Chris Blackford deseja aplaudir os Van Der Graaf Generator na publicação musical radical Rubberneck, ele argumenta que a voz de primeira classe de Peter Hammill é “imaculada de uma misoginia derivada dos blues”. Susan McClary, por outro lado, diz que “não há equivalentes brancos de Bessie Smith ou Aretha Franklin – mulheres que cantam poderosamente o espiritual e o erótico sem a estrutura misógina e punitiva da cultura europeia. “Tanto Blackford como McClary justificam os gostos com referências a um sistema moral que transcende tanto a arte como a sociedade com que lidam; e contradizem-se completamente. Apesar dos dois serem membros do campo “anti-sexista”, o típico desprezo “anti-rockeiro” dos ingleses e de Blackford pelos blues entra em contradição com McClary que escreve na América, onde os estudos sobre negros forçaram a um certo respeito crítico pela forma.
As dialéticas negativas, por outro lado, veem as formas como matérias sedimentadas: “analisá-las é o mesmo que nos tornarmos conscientes da história inerente armazenada nelas.” Em vez de reduzir os trabalhos artísticos a meros exemplos de ideias abstratas, traça a sua proveniência material. Claro, isto significa que o “julgamento” crítico deve, em última instância, relacionar-se com uma visão política global, uma ligação que é anátema do liberalismo, onde só um compromisso para com certas “ideias” pré-selecionadas separa os condenados dos livres. O suporte político da luta da emancipação negra nos E.U. da América significa que o uso de rags por músicos de vanguarda como David Murray ou Henry Threadgill ou Buell Neidlinger é visto como solidariedade social em vez de afastamento das instituições antiquadas (e no caso do neo-conservadorismo de Wynton Marsalis, talvez não – estas coisas só podem ser resolvidas pelo ouvido).
Vaneigem coloca uma abstração – a condenação do consumo – perante o contexto social onde ocorrem as coisas. Ele parece completamente alheado da necessidade de arranjar um bom disco para a festa de sábado à noite. Longe de ser consumido “aleatoriamente” em cadeias de lojas, a presença de Zappa no mercado tem sido uma luta, um empreendimento épico. Embora Zappa tenha começado como compositor autodidata com experiência em composição serial, a sua decisão de “obter público” não envolveu a supressão da lógica do seu material, por algo que agradaria aos ouvintes da classe-média. Ele também queria “matar a ignóbil rádio”, desafiar a anemia pop com R&B. Apesar das contenções da teoria pós-modernista, o antagonismo de classe ainda persiste. Não há nenhuma música que passe fluentemente do “simples” ao “complexo”: as diferentes formas musicais têm dinâmicas próprias. Zappa vislumbrou o seu caminho ao usar o materialismo do público em massa, a sua fome por novos efeitos e choque; uma maneira de subordinar essa dinâmica a um compromisso vanguardista dos novos sons.